Waldir Mantovani

fotos: Dalmo Oliveira

Mantovani diz que ciência não garante felicidade
Ambientólogo e epistemólogo da USP falou sobre construção da ciência na
atualidade em evento de iniciação científica da UEPB

Professor de gestão ambiental da USP, consultor do governo federal para questões ambientais, Waldir Mantovani é um crítico contundente do modelo brasileiro de formação de pesquisadores. Ele também costuma apontar problemas nas políticas públicas de preservação e diz que o termo “sustentabilidade” tem sido usado de forma equivocada por políticos e lideranças envolvidos com a questão ambiental no Brasil.
O ambientólogo proferiu a palestra “A construção da ciência”, nesta terça-feira, 23, dentro da programação do 2º Congresso de Pós-Graduação e Pesquisa e 17º Encontro de Iniciação Científica da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), no Centro de Convenções Raymundo Asfora (Garden Hotel), em Campina Grande.
Para Mantovani, a ciência não resolve a principal demanda humana: felicidade. “Não há uma satisfação plena, que possa ser alcançada através da ciência” alertou ao ser indagado sobre a proposta do senador Cristovam Buarque de colocar na Constituição Federal o direito dos cidadãos brasileiros à felicidade. “Imagino que o senador esteja querendo que se garanta a possibilidade do país possuir índices de felicidade, algo que não pode ser resolvido enquanto as oportunidades forem desiguais. Essa discussão tem que acontecer mais embaixo, antes da Constituição”, defende.
Sobre o fazer científico, ele diz que cada um percebe as coisas, a natureza, os fenômenos sociais, de forma diversa. “O que devemos estimular é a constante troca de formas de enxergar e analisar o mundo”, diz. Citando o filósofo da ciência, Karl Popper, Mantovani lembrou à plateia de neófitos que há três modos de olhar para as coisas do mundo: através das coisas do mundo físico (e biológico); pelo mundo interior (da psiquê) e pelas teorias científicas.
“É imenso o numero de pessoas que não conheceram outras realidades. Pessoas que nunca viram o mar, por exemplo. Essas pessoas tem um olhar leigo. Mas há também o olhar religioso, o olhar filosófico, o olhar da loucura e o olhar científico”, ensina.
Para Waldir, nenhum professor tem capacidade de ensinar em sala de aula. “Não há método de ensinar em sala de aula. Só é possível se o aprendiz experimentar”, afirma. O epistemólogo da USP também destacou a importância da divulgação científica, ao afirmar que “nenhuma ciência está completa se ficar na gaveta. É preciso desenvolver uma cultura científica”, propõe Mantovani, acrescentando que a popularização da ciência é algo diferente do conhecimento vulgar.
Para o especialista paulista, os novos pesquisadores precisam entender que as críticas à ciência não são críticas pessoais. “O cientista é apenas mais um a construir degraus do conhecimento que pratica”, diz Mantovani.
Eles também fez considerações sobre as ciências humanas e sociais, afirmando que nesse campo do conhecimento nada é totalmente novo e inédito e que o mais comum é utilizarmos a expressão “de acordo com...”. Significa dizer que nas ciências humanas nada se dá à priori, e que o principal critério de verdade é a verificação.
Mantovani falou também sobre nosso dia a dia não-racional, quando nos habituamos a usar as chamadas “zonas de conforto”, que são conjunto de ações e reações cotidianas não racionalizadas, automatizadas. “A racionalização tem um custo energético, que deve ser economizado para as práticas científicas. A Ciência é um desafio constante e um trabalho infinito”, sintetiza o estudioso.
Para que a ciência seja validada, Mantovani diz que os pesquisadores devem fazer com que as pessoas enxergem as lógicas científicas em cada pesquisa proposta. O epistemólogo afirma também que “as pessoas não sabem estudar, portanto, não sabem aprender”.
Para se tornar um pesquisador competente, Valdir Mantovani diz que o estudante precisa ter muita disciplina. Ele garante que a formação do conhecimento se dá através dos sentidos, da razão e da intuição. “Ninguém nasce com aptidão para tudo. É preciso descobrir as aptidões e investir nelas”, recomenda.
Outra ferramenta indispensável à qualquer pesquisa científica é o método, onde serão definidas as regras para a investigação pretendida. Mantovani lembra que a consulta e a revisão de literatura também são indispensáveis para vislumbrar o estado d'arte das teorias e conceitos que dão suporte à análise do objeto de pesquisa. “O investigador precisa definir bem o problema de pesquisa. O objeto de análise é diferente do problema da pesquisa”, explica. Para o ecólogo, as hipóteses são respostas verificáveis e é necessário se apropriar de uma boa definição de conceitos.
A grande diversidade dos campos científicos é outro desafio para os pesquisadores iniciantes. Segundo Mantovani, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) já indexou 10 mil áreas do conhecimento. Na sua visão, a iniciação científica não é feita durante a graduação, mas só na fase da pós-graduação, e é justamente nesse momento que se ressalta a importância do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), preparando os graduandos para os cursos de mestrado.
Mantovani acredita que o papel do educador mudou com o desenvolvimento da internet. “Não precisa mais distribuir conteúdos, pois os alunos encontram os conteúdos com facilidade na rede. O educador agora, mais do que nunca, deve provocar reflexões sobre os conteúdos da disciplina que leciona”, defende.
Citando Albert Einstein, ele finalizou a palestra falando sobre a importância das crises: “Devemos encarar a crise como sinalização para revisão de vida. Sem crises não há avanços. A verdadeira crise é a da incompetência”, atesta.
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Por Dalmo Oliveira
MTB-PB 0598
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